REFORMA TRIBUTÁRIA – PERÍODO DE TRANSIÇÃO – SOBRE A INCLUSÃO DE IBS E CBS NA BASE DE ICMS, ISS E IPI

4 de setembro de 2025

Estados e Municípios, diretamente e por meio de entidades representativas como o Comsefaz[1] e a Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos (FNP), defendem o cálculo “por dentro” considerando os tributos criados com a reforma tributária alegando que, sem isso, a (…) exclusão do IBS e da CBS reduziria de imediato as receitas municipais. Apenas no caso do ISS, a entidade estima queda de 10,8% em 2029, que chegaria a 16,2% em 2032, sem mecanismo de compensação. Segundo a FNP, a alteração resultaria em perdas líquidas e irreversíveis para estados e municípios, comprometendo o financiamento de serviços essenciais.[2]

Como sempre, a tônica é a perda de arrecadação, mas a pergunta essencial é: existe lei autorizativa? Como se verá a resposta, aparentemente, é negativa. É que tanto a Constituição Federal, com as alterações da EC 132/2023, na redação dos arts. 156-A, IX e 195, §17[3], assim como a LC 214/2025 no artigo 12, § 2º, I[4], preveem, em alusão ao IBS e CBS, que um não integrará a base de cálculo um do outro, assim como não a integrarão o Imposto Seletivo, o IPI, o ICMS e o ISS, afora o PIS, COFINS (na importação, inclusive) e a CIDE (iluminação e segurança).

Há previsão do que não comporá as bases de cálculo do IBS e da CBS, mas não há previsão permitindo que, em sentido inverso, sejam estes dois novos tributos excluídos da b.c. do ISS, ICMS e IPI, ou seja, a lei é silente. Na ausência de lei se defende a ideia de que há, nisso, permissão para que, no período de transição (até 31/12/2032), o ICMS, o ISS e o IPI contemplem, em suas b.c., o IBS e a CBS. O raciocínio dos defensores desta tese foi bem resumido em artigo da lavra de Marco Eurico Diniz de Santi, do Centro de Cidadania Fiscal[5]:

Em termos analíticos, a argumentação por eles apresentada pode ser assim decomposta:

  • Premissa 1: Se a Constituição excluir expressamente o IBS e a CBS da base de cálculo de certos tributos (p), então o IBS e a CBS não devem ser incluídos na base de cálculo desses tributos (q).
  • Premissa 2: a Constituição não excluiu expressamente o IBS e a CBS da base de cálculo do ICMS e do ISS (~p).
  • Conclusão: o IBS e a CBS devem ser incluídos na base de cálculo do ICMS e do ISS (~q).[6]

Ora, se não há lei não há autorização. Simples assim. Pouco importa se no atual regime tributário existem regras expressas prevendo que o ICMS integra sua própria b.c., p.ex., assim como não afeta este raciocínio o fato de que havia previsão inicial, na PEC 45/2019 (deu origem à EC 132/2023), de expressa exclusão do IBS e da CBS das b.c. do ISS, ICMS e IPI no período de transição, algo que não consta no atual texto da LC 214/2025 de modo explícito.

É preciso deixar muito claro que o texto constitucional só autoriza a cobrança de tributos que obedeçam ao princípio da legalidade (art. 150, I, c/c o art. 3º do Código Tributário Nacional-CTN[7]). Lei expressa prevendo o cálculo por dentro ou a inclusão do IBS e CBS no ISS, ICMS e IPI é inafastável porque o mesmo CTN prevê (art. 108, I e §1º) que a analogia, que é o que se pretende quando se compara o sistema tributário atual com o futuro, apenas serve para a aplicação da lei – mas não para criação de tributos.

O que soa tão basilar é escanteado para atender à necessidade de custeio de despesas, sem que se lancem ideias de redução do custo da máquina pública. Por isso é preciso reforçar o básico, diante do apetite arrecadatório, em um novo Projeto de Lei Complementar – PLP 16/25[8] que tramita na Câmara dos Deputados[9], o qual pretende deixar expresso que o IBS e a CBS não comporão a b.c. de outros tributos.

Mesmo na remota hipótese deste PLP não ser convertido em lei, por ofensa ao princípio da legalidade não se legitimará eventual exigência sobre toda e qualquer operação. Excepcionalmente se admitiria nas importações, devido à redação do art. 13, V, “e” da LC 87/1996[10], o qual prevê que a base de cálculo do imposto, no desembaraço aduaneiro, compreenderia também (…) quaisquer outros impostos, taxas, contribuições e despesas aduaneiras. Afora isto, dado que que o IBS e a CBS, por sua natureza, são calculados por fora (não integram suas próprias bases e nem um a do outro, afora a do imposto seletivo e do PIS-COFINS-Importação), soaria também incoerente por atentar contra o princípio da neutralidade, simplicidade, transparência e justiça tributária (conforme art. 145, § 3º do texto constitucional – redação da EC 132/2023[11]).

Espera-se que este tema não venha a se converter em uma nova tese do século, em que a discussão judicial sobre a indevida inclusão do ICMS na b.c. do PIS e da COFINS gerou uma derrota histórica para a União Federal. Espera-se que o bom senso prevaleça, pois senão o leitor terá mais uma certeza: a de que o Brasil passará a uma escala ainda mais baixa do Índice de Segurança Jurídica e Regulatória (INSEJUR), em que ocupa a vergonhosa 35ª colocação[12]!

Darcy Zanghelini Junior – OAB/PR 21.735 (Escritório Curitiba)

 

 

 

[1]     Comitê Nacional de Secretários de Fazenda, Finanças, Receita ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal.

[2]     BONFANTI, Cristiane. Reforma tributária: governos devem incluir IBS e CBS no ICMS, ISS e IPI. Revista eletrônica Jota, em 26 ago. 2025. Disponível em https://shre.ink/tmvj. Acesso em 03 set. 2025.

[3]     Disponível em https://shre.ink/tmvt. Acesso em 03 set. 2025

[4]     Disponível em https://shre.ink/tmvF. Acesso em 04 set. 2025.

[5]     DE SANTI. Eurico Marcos Diniz. O absurdo lógico e jurídico da inclusão do IBS e da CBS nas bases de cálculo do ICMS e do ISS. Revista eletrônica Jota, em 17 jul. 2025. Disponível em https://shre.ink/tmv0. Acesso em 03 set. 2025.

[6]     Em lógica, um “til” (~), representado como um diacrítico (antes de um número ou símbolo), significa “aproximadamente”, como por exemplo”~42”, indicando que um valor é perto de 42, mas não exatamente. Por outro lado, sendo um sinal antes de uma variável ou proposição, pode estar associado à uma negação lógica (como neste texto), onde o “~q” significa “não q”, ou a equivalência lógica em alguns contextos de programação.

BIANCHI, Luiz. Lógica Matemática. Website Lumadi. Disponível em https://shre.ink/tmvP. Acesso em 04 set. 2025.

[7]    Disponível em https://shre.ink/tmXO. Acesso em 04 set. 2025.

[8]    Projeto de Lei Complementar 16/2025. Disponível em https://shre.ink/tmCW. Acesso em 04 set. 2025.

[9]    Projeto altera base de cálculo de impostos sobre o consumo. Site da Câmara Federal. Disponível em https://shre.ink/tmXu. Acesso em 04 set. 2025.

[10]   Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp87.htm. Acesso em 04 set. 2025.

[11]   Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em 04 set. 2025.

[12]   MARCELINO, Daniel; TREVOR, Valentina; MELO, Fernando. Segurança Jurídica no Brasil está entre nível moderado e baixo, aponta INSEJUR. Disponível em https://shre.ink/tmXt. Acesso em 04 set. 2025.